Dear Hongrang: ser alguma coisa para alguém

Dear Hongrang: ser alguma coisa para alguém

“Estou acostumado em tentar ser alguma coisa. As pessoas nascem com um certo tipo de nome, como filho de alguém, irmão de alguém ou primo de alguém. Mas eu nunca fui algo de alguém.” 

Creio que, em algum momento de nossas vidas, nos questionamos sobre ser alguém na vida e baseamos nossas escolhas de faculdade e emprego nesse pensamento: ser alguém! De forma sutil, Dear Hongrang me fez questionar isso e concordar com tal afirmação: estamos sempre buscando ser algo. 

Dear Hongrang marca a volta de Lee Jae Wook às telinhas, com o gênero mistério-histórico. A trama narra a história de uma família rica de comerciantes de arte no final da Dinastia Joseon, que sofre com o sumiço misterioso do seu herdeiro, Sim Hong Rang. Após anos de procura, um jovem aparece afirmando ser esse herdeiro perdido. Dirigido por Kim Hong Seon, o drama pode ser encontrado na Netflix.

É uma surpresa estar escrevendo sobre um drama histórico, não é o meu gênero preferido, mas Dear Hongrang me chamou a atenção desde do lançamento do trailer, e resolvi dar uma chance para um drama desse gênero. Não me arrependo de tal coisa. Lee Jae Wook teve, talvez, a sua melhor interpretação. Seu personagem tem várias camadas e tantas dores que chega a ser difícil descrever a complexidade de Hong Rang. Da mesma forma, Cho Bo Ah, brilhou como Sim Jae I. Nesta trama não tinha nenhum personagem leve, todos tinham suas complexidades, uma característica de dramas históricos. 

Fazendo jus ao mistério, o drama nos prende primeiro com a pergunta: o que aconteceu com o Sim Hong Rang? Depois que o suposto Hong Rang retorna, surge outro questionamento: ele é realmente o Hong Rang? A segunda pergunta é respondida no terceiro episódio 一 aquele é o falso. (Só uma coisa para não ficar confuso: toda vez que aparecer “Sim Hong Rang”, estarei me referindo ao Hong Rang verdadeiro). Então, por que ele está fingindo? O que sabemos sobre o sumiço do Sim é que ele desapareceu na floresta, sendo levado por uma “criatura”. Em outras palavras, o drama tem um bom mistério e várias perguntas a serem respondidas.

No meio de todo o caos, temos a jovem Sim Jae I, que ama profundamente seu irmão desaparecido. Logo que o falso Hong Rang aparece, ela é a única a afirmar que aquele à sua frente não era seu verdadeiro irmão. Começamos a perceber que, para Jae I, Sim Hong Rang era seu único porto seguro dentro da família totalmente disfuncional que ela nasceu: o típico casamento sem amor, uma madrasta louca e cruel, que ama perturbar o juízo da nossa protagonista.

No caminho da desconfiança, ela e o Hong Rang começam a se aproximar. Para Jae I, essa aproximação é uma tentativa para desmascará-lo e, no caso do Hong Rang, é uma estratégia para ganhar a confiança dela, essencial para seus planos. Nesse ponto, percebemos que vai surgir um romance no meio do caos. 

Jae I cuidando do Hongrang. Reprodução/My Drama List

Chega o momento em que o drama nos leva à frase do início da resenha: ser algo para alguém ou simplesmente ser alguma coisa. Essa frase aparece quando o protagonista começa a questionar seus sentimentos pela Jae I. É o Hong Rang que diz isso, e, ao ligarmos os pontos com seu passado, entendemos quão profunda é essa afirmação. Ele pode até não ser o verdadeiro Sim Hong Rang, mas, naquele momento, ele queria ser algo, já que, quando era criança, foi sequestrado e passou pelo pior. É nessa frase que Hong Rang consegue desarmar Jae I, e ela passa a ser mais flexível.

Falando sobre o passado do protagonista, em um certo momento, achei que ele estivesse ali para investigar o sequestrador conhecido como “Pintor”, o grande vilão desse drama. O pobre Hong Rang foi sequestrado quando criança e torturado em um ritual louco de um homem rico, obcecado por arte, que acreditava que conseguiria se tornar uma divindade. Não irei revelar quem é o vilão, o bom do drama é o mistério.

Mas ele não estava ali só para isso. Havia uma organização por trás dele que buscava vingança contra a família Sim. O drama tem várias pontas que vão se ligando ao longo dos episódios. Diria que o diretor foi muito corajoso ao inserir tantas camadas, levando em consideração que é um mini drama com apenas 11 episódios. Algumas vezes me questionei se daria para resolver tudo, afinal, o romance começa a ganhar força praticamente no episódio 5 e quando digo “força”, quero dizer que Jae I começa a considerar Hong Rang como seu irmão, enquanto ele está lutando firmemente contra esse sentimento.

O drama consegue, de certa forma, responder quase todas as nossas perguntas e entrega um bom final para o vilão — um desfecho que ele merecia. Já o final dos protagonistas tem um gosto agridoce: para quem gosta de finais felizes, é bem mais agri do que doce, mas faz sentido com tudo que nos foi apresentado. Dramas históricos normalmente têm esse sabor, e é um dos motivos que eu fujo deles, não pelo fim triste, e sim pelo sentimento de melancolia que carregam.

Porém, Dear Hongrang tem esse “algo a mais”. Foi triste, foi melancólico e doloroso, mas também foi emocionante, tocante e cheio de lições. No fim, não era só o protagonista que queria ser algo. Todos os personagens, de alguma forma, buscavam essa validação: Jae I tentando ser uma boa irmã; o líder da família Sim tentando ser um bom líder e comerciante; a senhora Sim tentando ser uma boa mãe. Todos em busca de ser algo. Até mesmo o vilão queria ser algo. E, talvez, esse seja o mal do ser humano: a busca constante por ser algo a mais — quando, às vezes, o que mais precisamos é apenas ser nós mesmos.

Normalmente, não gosto de romances nesse tipo de história, mas o romance de Jae I e Hong Rang encaixou perfeitamente, porque ambos precisavam um do outro para curar as feridas e, finalmente, conseguir ser esse “algo”. No caso do Hong Rang, ele havia perdido tudo desde seu sequestro, quando criança, e passou a vida toda tentando/buscando ser qualquer coisa. Por muito tempo, se privou da felicidade, tanto pelas marcas em seu coração quanto pelas marcas que ele carregava no corpo, que o faziam se sentir sujo e indigno.

Já Jae I foi, por um tempo, a irmã do pequeno Sim Hong Rang e, quando esse irmão se perde, é como se ela perdesse o sentido da própria existência, como se sua identidade estivesse atrelada apenas a isso, e era compreensível, já que só o irmão a enxergava. Hong Rang foi curando, aos poucos, as feridas do coração dela, Jae I encontrou o conforto que há muito tempo não sentia e deixou de se prender à culpa pelo desaparecimento do irmão. 

Por fim, se tivéssemos mais episódios, talvez o romance pudesse ter sido mais aproveitado, já que a química do Jae Wook e da Bo Ah é perfeita. Preciso destacar, mais uma vez, como a interpretação do Lee Jae Wook foi incrível — ele conseguiu transmitir tudo só com o olhar. Outro que também foi impecável foi o Kim Jae Wook como o príncipe Han Pyeong, ambos me fizeram sentir, verdadeiramente, o que os personagens estavam sentindo. Talvez eu tenha deixado várias coisas de fora, mas qualquer detalhe a mais poderia tirar a graça da emoção do mistério. Além disso, o sentimento de “ser algo” foi o que me marcou profundamente.

Atallie França

Estudante de Licenciatura em Ciências Biológicas e escritora. Sempre foi viciada no novo e em descobrir novas culturas, apaixonada pela escrita, livros e músicas. Divide essa paixão com os dramas desde 2017, sempre buscando entender e analisar aquilo que as histórias querem contar.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *