The Best Thing: o afeto que floresce no silêncio do cultivo

The Best Thing é uma lufada de ar fresco que celebra o amor sereno, refletindo o poder de cura que brota da natureza e do afeto silencioso presente no gesto de cultivar mudas. Assim como uma flor que está no período de inverno, conhecemos nossa protagonista, Shen Xi Fan (Xu Ruo Han), uma gerente de hotel que está passando por um momento difícil em sua vida, ela sofre de insônia e enxaquecas frequentes, causadas por seu relacionamento amoroso conturbado.
A maioria das flores não desabrocham no inverno, como a luz é pouca e o solo é duro, elas se recolhem e tentam sobreviver a difícil estação. É o momento de se voltar para dentro, de reunir suas forças e no silêncio da espera encontrar significado no ato de cuidar de si mesma. Shen Xi Fan é assim, no inverno frio de sua vida, ela conhece He Suye (Zhang Ling He), ele é o médico de medicina tradicional chinesa (MTC) a quem recorre para tratar sua insônia. Perdida e sem direção, as consultas frequentes com o Dr. He permitem a Xi Fan um momento para respirar, para curar seu corpo e sua alma. Um momento de repousar no frio para ter coragem de sair quando for a hora.
Para o Dr. He, um médico bonito e brilhante em sua profissão, o inverno também deixa marcas, ainda que ele próprio não perceba. Acostumado a cultivar jardins e a cuidar das dores alheias, quase nunca se permite enxergar as cores e a beleza que o cercam. No frio da estação, o mundo parece cinza, silencioso demais. Mas então ele conhece Shen Xi Fan, e é como amor à primeira vista. Aos poucos, sua vida ganha novas cores, e cada encontro com ela é como um broto que floresce no gelo. Vívido. Esperançoso. E que cresce aos poucos, mesmo com as intempéries da estação.
É uma relação que nasce de um contato médico e paciente, mas que ultrapassa essas barreiras. Xi Fan e Dr. He constroem um laço que é regado aos poucos. Primeiro, eles se aproximam lentamente. Xi Fan ainda precisa passar pelo inverno frio, resolver suas questões internas e lidar com os traumas do seu relacionamento amoroso. Logo, se Dr. He se apaixona por Xi Fan à primeira vista, o mesmo não acontece com ela. Nossa protagonista ainda está muito machucada, e só deseja voltar a dormir bem e sanar algumas de suas preocupações. O relacionamento que ela tem com seu namorado é abusivo, ele insiste em rebaixá-lá, culpá-la e minar sua autoestima. As cenas que denotam essa relação são desconfortáveis e dotadas de angústia, mas também permitem ver como Xi Fan passou a acreditar que não é digna de florescer e que o inverno só pode trazer infortúnios.

The Best Thing sabe que, para amar o outro, a gente precisa amar a si mesmo e aprender a cuidar de nós. Então, a cada vez que Dr. He cuida de Xi Fan, seja com um remédio, uma palavra reconfortante ou um saquinho aromático, ela vai aprendendo como aliviar seu coração, que as flores não podem achar que não têm beleza no inverno ou que os momentos ruins são eternos. Ela aprende a tomar seu remédio e apreciar o ato de cultivar lentamente sentimentos bons em seu coração. O Dr. He está lá não para ser a causa máxima e única razão de Xi Fan se encontrar, mas para mostrar que é bom ter alguém regando, segurando sua mão nos momentos difíceis, para poder florescer. E esperar a primavera chegar.
Ter alguém para te segurar antes que caia no abismo e que te ensine a cultivar seu próprio jardim é um ato que mostra que amar a si mesmo vem da iniciativa de quem escolhe cuidar de si. E não é um processo fácil. Para Xi Fan, ter recaídas é normal, mas ter alguém segurando a mão dela e que continue regando suas raízes é importante. Oferece a oportunidade dela procurar coragem em si mesma. E arrisco a dizer que para o Dr. He, seja a mesma coisa. Ele e a Xi Fan demoram para engatar em um relacionamento romântico, mas no lento processo de cultivar, ele se abre novamente, de forma silenciosa, e revisita algumas de suas dores em relação à família, à sua mãe e ao seu pai e, com seu jeito reservado, aprende o poder da iniciativa, da espera e do encontro. A força de quem encontra, no próprio coração, a coragem silenciosa de florescer por dentro.
The Best Thing é um drama marcado pelas quatro estações. Digo isso porque poucas coisas expressam tão bem a força da natureza e do tempo como o ciclo das estações, com seus começos, transformações e silêncios. Assim como muitos outros dramas, ele se apoia nesse ritmo natural para contar sua história, revelando os personagens e o desenrolar de suas relações por meio da passagem do tempo e da mudança das paisagens. Logo, vemos os personagens passar pelo inverno, mas também quando a primavera chega na vida deles.

E é na primavera que as flores desabrocham. Como a estação do começo ou do recomeço, quando ela chega também notamos que os sentimentos de Xi Fan e Dr. He ganham efervescência. O inverno é a preparação para a primavera. As flores desabrocham na primavera, mas é no inverno que elas se fortalecem para florescer. E que exemplo melhor do que a própria tulipa? Uma flor que está presente no drama recorrentemente, ela é como Xi Fan, já que as tulipas precisam do frio para florescer bem. E mesmo delicadas, carregam força.
Mas, além disso, Xi Fan possui o hábito de presentear o Dr. He com tulipas, e ele também possui uma ligação especial com a flor, ela lembra a mãe dele. O ato caloroso de presentear com flores marca o andar da relação dos personagens e pelas cores da tulipas que recebem ou trocam entre si, é possível perceber a fase do relacionamento que estão ou os sentimentos presentes. A cada nova tulipa, uma cor diferente. As tulipas são as primeiras flores a florescer na primavera. E dependendo de sua cor, seu significado se modifica. Por exemplo, a tulipa branca que Xi Fan oferece à mãe de Dr. He significa paz e respeito. A tulipa azul, presente nos buquês que Xi Fan e Dr. He compartilham na cena do guarda-chuva, simboliza um amor sereno e duradouro, um laço de confiança silenciosa que floresce entre eles, mesmo em meio à chuva.
A sorte de ter um amor tranquilo é uma frase que denota com exatidão o tipo de amor estabelecido entre nossos protagonistas. É gradual, singelo e delicado. Repleto de cuidado e carinho. A química entre a Xuo Ruo Han e o Ling He é maravilhosa, as cenas românticas esbanjam naturalidade e conforto – e os dois atores são tão bonitos, que combinam tanto. O relacionamento dos personagens é repleto de silêncios e trocas de olhares, seja Suye observando Xi Fan ou ela olhando para ele, são cenas muito bonitas que mostram através de gestos todo o afeto compartilhado entre eles. E juntos, eles crescem e cultivam seu próprio jardim, em que as flores crescem e os sentimentos vão se fortalecendo. Xi Fan e Dr. He vão se preenchendo de felicidade ao estarem juntos. Ele é um personagem perfeito, sereno, repleto de qualidades, e carrega consigo um amor profundo e uma paciência que acolhe, sem pressa, os tempos do outro. Assim, é uma relação tranquila e calma, sem desavenças desnecessárias.
A forma que o drama escolheu compor sua fotografia, os cenários escolhidos e a direção contribuem para espalhar essa tranquilidade que a trama emana, seja do relacionamento dos dois ou da sensação que se sente ao assistir. A natureza está recorrentemente presente em The Best Thing, a todo momento vemos plantas, árvores e flores. Não somente a tulipa, mas a magnólia ou a madressilva e outras, cada uma delas tem seu simbolismo na trama. É reconfortante ver uma fotografia repleta de verde e da calmaria que a natureza proporciona.
O mais incrível é que essa escolha consciente da presença da natureza é uma combinação perfeita com um dos assuntos da trama, a medicina tradicional chinesa. Como o Dr. He é um médico de MTC, as ervas, massagens, aconselhamento de exercícios, tudo que faz parte dessa prática médica ganha destaque na narrativa. A produção faz um trabalho cuidadoso em mostrar a importância e algumas coisas básicas da medicina tradicional chinesa. Como não sou conhecedora, não sei até que ponto a representação foi precisa, mas foi legal aprender um pouco sobre isso. E, como não parecia algo solto na trama, estava bem amarrada com a história dos protagonistas.
Para se ter ideia, cada título de episódio vem com o nome de uma erva/planta juntamente com seus benefícios e efeitos. Elas não estão lá somente como algo informativo, mas também estão interligadas com o conteúdo do episódio. Para ilustrar melhor, dependendo da erva/planta denotada no título do episódio, eu conseguia saber se seria um episódio mais melancólico ou se seria um bem feliz. Isso porque as próprias características medicinais da erva em questão já revelavam para mim o tipo de emoção que seria retratado no episódio.
Assim, além de aprender sobre várias ervas/plantas que não conhecia e, como uma amante de chás, isso foi um deleite para mim, eu também me deliciava com as analogias e interlocuções da história contada no episódio com a erva/planta em questão. Por exemplo, lembro do episódio com o título da casca de laranja, utilizada para tratar a gripe, que é usada em um momento em que os personagens estão um pouco mais distantes um do outro. Já o feijão vermelho, conhecido por ajudar a eliminar toxinas, surge no momento da reconciliação, simbolizando a limpeza das mágoas entre eles.
Outro detalhe delicado é o próprio nome de He Suye, que remete à folha de Perilla — planta também usada para acalmar, aquecer e cuidar. E até mesmo o Agarwood, madeira resinosa escura e perfumada, que é usada para representar como a Xi Fan vê o He Suye, ela diz que é um cheiro parecido com ele, revelando a natureza suave, séria e agradável do personagem. E, a partir daí, ela sempre carrega um saquinho aromático de Agarwood, como um símbolo da calmaria e cuidado que ele propicia a ela.

São nesses detalhes preciosos que a trama se constrói, é na delicadeza do cuidar que a narrativa mostra o processo de cura, mas também oferece um breve momento de pausa e aprendizado, um respingo de esperança nos dias atribulados de quem assiste. Quando as estações mudam, também aprendemos que podemos mudar. Por exemplo, quando o verão chega, os sentimentos dos personagens se intensificam, tudo parece mais vívido, mais quente, mais entregue. Já no outono, é a melancolia que se insinua: despedidas, silêncios e momentos difíceis surgem, mas carregam também uma beleza suave. Do mesmo modo, quando cada nova planta/erva é apresentada para o público, percebemos a riqueza do que está ao nosso entorno e também aprendemos sobre cuidar de nós mesmos.
É uma narrativa curativa e singela, mas não está isenta de defeitos. Os personagens secundários tiveram pouco desenvolvimento e, se fossem melhores utilizados na narrativa, poderiam parecer mais carismáticos, sua história seria mais atrativa e isso certamente teria deixado o drama mais otimizado. A reta final da história ganha um contorno mais apressado, que não combina com o restante da narrativa que é mais cadenciada, isso prejudica o arco da mãe da protagonista que, apesar de interessante, poderia ter sido colocado antes ou até mesmo poderia não ter sido colocado. Juntamente a isso, o espaço temporal, inserido na reta final, também é prejudicado. No entanto, mesmo com esses defeitos, o episódio final é agradável e facilmente todos os fãs de romance vão amar.
Por fim, The Best Thing nos mostra como os pequenos gestos são preciosos, não adianta nada um buquê de rosas vermelhas enormes, se elas não têm o afeto espelhado nelas, o silêncio do cuidado é muito mais potente que isso. Dr. He é o solo fértil que permite a Xi Fan florescer por si mesma, não um salvador. O amor entre eles não é exigente, mas doador. Não atropela, mas acompanha. É como cada vez que uma planta é regada, vagarosamente, até que ela possa florescer em seu próprio tempo. The Best Thing nos mostra que existe potência na constância, na escuta e na metáfora do cultivo da vida, da cura e do amor.
“Espero que todas as pessoas de coração bom consigam encontrar nas brechas da vida, um amor sereno e duradouro. […] Não se preocupe, aprenda a se amar primeiro. E então, alguém aparecerá na luz das brechas“