Mouse: Predadores, presas e a complexidade humana

Saudações! Como vão? Eu – Brenda – vou bem, mas atarefada e, como sempre, procrastinadora, é por conta disso que a resenha de hoje quase não saiu do forno, pois adiei horrores. Na verdade, eu já estava quase desistindo de escrever ela por inúmeros motivos, mas a Alice não me permitiu e cobrou mesmo kkk então Alice essa resenha é dedicada especialmente a você KKK (se ela ficar ruim, aceite mesmo assim). Vou parar de fazer mistério e ir direto ao ponto, o drama resenhado hoje é Mouse, votado pela maioria de vocês como escolhido para ser resenhado primeiro (da minha longa lista de resenhas). Vocês podem encontrar o drama para ser assistido no Rakuten Viki. Agora quero convidar vocês para conhecerem um dos dramas que fazem parte do meu top3 de 2021 até agora, vamos lá?
Mouse tem como gêneros principais o Suspense, Thriller, Mistério, Psicológico e Crime, ele é um drama da nossa querida tvN (que só acertou esse ano até agora) e possuir 20 episódios + uma quantidade relevante de episódios especiais (ao todo 4 episódios, salvo engano). É difícil resenhar Mouse, pois, existe complicações em resumir do que a história se trata. Mas, em uma tentativa simplória, a obra tem como ponto central os psicopatas, no universo do kdrama é possível detectar o gene psicopata nas crianças antes mesmo de nascerem por meio de um exame, assim a história apresenta três possíveis crianças com esse gene que crescem e se tornam adultas (então já devem imaginar o que se esperar). Entre elas, temos o filho de um serial killer perigoso “o caçador de cabeças”, e temos uma série de assassinatos acontecendo, dois policiais interessados no caso e duas mulheres que estão presentes na vida desses policiais. Na medida que o drama se desenvolve descobrimos que todos estão relacionados ao mistério principal (que não vou revelar aqui porque é o spoiler né).
Dessa forma, o drama gira em torno de questões morais, do tipo “O que faríamos se pudéssemos antecipar os passos de um psicopata?”, “O que aconteceria se soubéssemos quem é psicopata desde o ventre da mãe?”, “É correto matar as crianças com gene psicopata antes mesmo de nascê-las?”, “O que você faria se um conhecido seu ou até mesmo seu filho fosse um psicopata?”, “O que move um psicopata?”, “até que ponto a sociedade contribuir para formação de psicopatas?” entre outras. Enfim, ao longo de seus 20 episódios, o drama faz refletir sobre essas e tantas outras questões, não conseguirei apresentar todas nessa resenha, mas vou tentar.
Mouse possui muitas cenas brutais, por ter o gênero psicológico, a história tem uma carga pesada, que muitas vezes é difícil de ser digerida. O primeiro episódio do K-drama foi um dos mais pesados que já assisti, para se ter ideia terminei o episódio com dor de cabeça, é um episódio que mexe com temas sensíveis, mas, entrega muito bem o potencial da obra e o clima da história. Mouse faz isso tudo, sem precisar utilizar de cenas muito explicitas, a forma que a história é conduzida torna-se pesada pelos acontecimentos é claro, mas também pela carga psicológica que carrega. Logo, é preciso avisar que o drama contém gatilhos, a violência, abuso sexual, violência infantil, maus tratos aos animais. Não recomendo o drama a todos, só quem tiver com um psicológico forte para essa jornada.
Para mim, o grande mérito da obra é conseguir atingir em cheio as emoções, muito mais que um drama de perseguição policial e crime, Mouse sensibiliza, humaniza e transmite muito bem todas as emoções dos personagens presentes na trama. Nesse sentido, o ponto que mais gosto é como os personagens são bem construídos, cada um na trama tem seu próprio dilema para enfrentar e cada um está envolvido, de uma forma ou de outra, no mistério central da história. Os personagens têm suas próprias crises emocionais e não é difícil se apegar a eles, por mais tortuosos que sejam. Aliás, se tem uma coisa que Mouse tem é personagens com defeitos e que sofrem muito, então ao trilhar o caminho de assistir a trama o sofrimento é certeiro e, provavelmente, quem está assistindo vai sofrer com eles, querer bater neles, torcer para que eles se mostrem pessoas melhores, ficar triste ou feliz com eles, ficar enojada deles e, consequentemente, passar alguns panos para eles.
Fiquei pensando se apresentaria os personagens para vocês ou não, mas vou tentar de forma superficial, aliás essa resenha vai ser bem superficial pois é um drama de mistério e a resenha vai ser livre de spoiler. Em Mouse, conhecemos Ba Reum, interpretado pelo Lee Seung Gi, ele é um policial novato simpático e gente boa, que tem sua vida mudada por um caso de assassinato em série. A jornada do Ba Reum durante a trama é surpreendente, angustiante e emocionante. O personagem do Ba Reum nos conduz em uma avalanche emocional enorme, é uma montanha russa, é um personagem que contém muitas emoções, camadas, vai além da multidimensionalidade e é incrível que a atuação perfeita do Seung Gi captou cada uma delas, cada nuance do personagem, todas as crises emocionais do Ba Reum, já que o mesmo sofre por uma pesada crise de identidade, são transmitidas devidamente (atuação do Seung Gi em Mouse é um show à parte). O Ba Reum é também meu personagem favorito da obra, pela complexidade de sua construção e a força da mesma, por ele ter sido um personagem que não gostei no início, depois passei a gostar, até não saber o que senti em relação a ele, e por sua cena final ter sido tão bonita e poética.
Outro personagem central em Mouse é o detetive Moo Chi, interpretado por Lee Hee Joon, ele teve sua família morta pelo psicopata serial killer caçador de cabeças quando era apenas uma criança. Desde então, Moo Chi, virou policial, e cresceu com o desejo de matar o assassino de seus pais, carregando toda a amargura em seu coração. O nosso detetive é bem explosivo e emocional, em muitos momentos, esse jeitão dele me deu raiva, principalmente porque ele se recusava a abrir os olhos para certas coisas e pelas suas ações precipitadas. Na trama, ele foi para mim um personagem que eu podia confiar, é possível ver quão gente boa, infantil e frágil o Moo Chi é, então foi impossível não torcer pela felicidade dele e me sentir triste perante seus sofrimentos. Um personagem bem forte emocionalmente de ser interpretado também e o ator também tem meus elogios por ter contribuído para criar um personagem tão humano, falho e cheio de dores, fazendo isso tão bem.
Temos também a Bong Yi, interpretada pela Park Joo Hyun, a personagem é uma menina com um forte trauma do passado, sofrendo de ataques de pânicos e outros sintomas adversos ao bem estar psicológico, na verdade, se fosse definir diria que ela sofre de transtorno de estresse pós traumático (mas não sou psicóloga, então né kkk sou só palpiteira). A Bong yi vive sozinha com sua avó, é vizinha e tem uma aparente queda pelo Ba Reum. Durante a trajetória de assistir Mouse peguei muito afeto a Bong yi, que apesar de ter umas atitudes escrotas no início, são decorrentes também de sua condição traumática, e mesmo tendo me irritado com isso e outras inúmeras atitudes dela, pude ver ali uma menina muito forte, doce e justiceira, torci muito também para a felicidade dela e sua trajetória foi a que mais me arrancou lágrimas (Sim, Mouse arranca choros de quem está assistindo). Elogios também a atuação de Joo Hyun, que estou acompanhando todos os seus trabalhos e venho gostando muito.
A última personagem que vou comentar é a Choi Hong Joo, interpretada pela Kyung Soo Jin, ela é produtora e apresentadora de um programa de tv investigativo (pelo que entendi), em um primeiro momento não sabemos exatamente como a Hong Joo está envolvida com essa história toda, mas ela tem um forte interesse pela história do caçador de cabeças e também pelo caso de assassinatos em série que acontece no drama. A jornada da Hong Joo no drama é complicada, a personagem tem uma história complicada, e um passado bem forte também e alguns segredos, não pude entender algumas de suas ações, ela também me irritou, mas posso dizer que é uma interessante jornada de uma mãe, filha e irmã, que carrega muito de culpa dentro de si.
Além desses quatro personagens centrais, a história também possuir muitas outras histórias de fundo e paralelas que permitem não deixar a trama parada. Existe também na narrativa a tentativa de inserção de um romance entre o Ba Reum e a Bong Yi, confesso que não foi um elemento que gostei de ser colocado na obra, não havia necessidade ao meu ver e não senti química romântica entre os personagens, a todo momento só conseguia pensar nos dois como irmãos, sem contar nas outras conjunturas que isso implicava. Na verdade, todos os personagens de Mouse têm química entre si, mas acompanhar a relação de amizade entre o Ba Reum e o Mo chi foi um dos pontos que mais gostei, bem como a do Mo chi e da Bong yi, são laços que não precisam ser românticos, mas que arrancam lágrimas, cenas bonitas e dores. Ainda sobre os personagens, gostaria que a história tivesse reservado mais tempo para trabalhar a personagem da Hong Ju, que passou a maior parte da trama envolta em segredos. Mas, também que tivesse aproveitado melhor as personagens femininas em si, que ao meu ver tinham mais potencial de aproveitamento do que foram, em comparação com Mo chi e Ba Reum que tiveram uma construção maior.
Tenho também reclamações no que se refere aos aspectos técnicos, não reparo muito nesses detalhes na maioria dos casos, mas aqui gostaria que as transições de cena tivessem sido melhores inseridas, é um aspecto necessário no sentido de não se perder na história e visual também. Não me perdi durante a trama de Mouse, até porque a equipe fez um importante papel em deixar a história o mais clara possível dada a quantidade de informação que é recebida – os episódios especiais contribuem nisso do esclarecimento – no entanto se esse aspecto técnico tivesse sido melhor inserido seria um ganho para a história. Outro ponto do aspecto técnico é que não lembro de nenhuma OST que particularmente tenha me marcado na obra, mas também tem o agravante de ter ficado tão concentrada no mistério que isso não me importou.
Mesmo assim, o enredo de Mouse é bem construído, o mistério realmente prende sua atenção, se for maratonar capaz dos 20 episódios passarem em um piscar de olhos, tamanha a imersão que a história proporciona (mas não recomendo maratonar pela carga psicológica da história). O enredo é cheio de reviravoltas (até o ultimo episódio) e apesar da reposta para o mistério inicial parecer obvia desde de o início (para mim foi), o drama engana, confunde e desvia nossa atenção milhares de vezes, só para durante a história efetuar mais uma série de reviravoltas, e no final revelar o mistério principal que liga todos os pontos.
Alguém me disse uma vez que Mouse nunca foi sobre descobrir quem é o psicopata, e concordo com isso, esse é um dos pontos da história, mas não é o central. A trama é muito mais a respeito do “como” e “porquê”, da forma que psicopatas agem, do que eles vivenciam, de como a sociedade reage a eles e de sua brutalidade. Mouse é uma série de interrogações sobre os psicopatas, e cria um universo de possibilidades para se refletir sobre essa temática, indo desde da apresentação do psicopata em si, do que é taxado como psicopata, dos familiares do psicopata, das pessoas que são vítimas dos psicopatas, dos conhecidos do psicopata.
Assim, por mais absurdo que seja, o drama faz sentirmos como se fossemos parte da trama de um psicopata, como se fossemos verdadeiros ratos como o título bem diz, que estão sendo a todo momento testados no universo de teorias e reflexões que a história proporciona, bem como no universo de emoções. Mas também é como se os psicopatas da trama fossem ratos que caçamos, tentamos saber quem é, um verdadeiro jogo de predador e presa. Vendo por esses dois lados, ao assistir Mouse realmente senti como se fosse uma conhecida do assassino central da trama, que em um primeiro momento não sabia quem era, apesar de desconfiar, e depois pude sentir toda amargura e dor do processo que a trama apresentou. Porém, também me senti como se o assassino central estivesse fazendo de mim sua presa tentando me enganar, e embolar em toda a doidera que é a história. Em suma, fiquei sem folego a cada final de episódio.
Mouse utiliza do universo da ficção para construir o cenário da história, recorrendo a todos os “e se”, que permitem pensarmos no futuro e no nosso presente enquanto seres sociais. O drama tem uma vibe de ficção cientifica, criando uma premissa bem original que poderia sim ter enveredado em caminhos mais complexos ainda, mas que dentro do que se propôs cumpriu tudo e respondeu todas as perguntas, as que não foram respondidas são aquelas que contém um teor critico a sociedade que permitir pensarmos em possibilidades e reações futuras, a como estamos vivendo. O episódio final do drama fecha todas as lacunas, consegue equilibrar o bonito, com o triste e com a felicidade, na verdade é bem agridoce, e de quebra ainda nos deixa com uma pulga atrás da orelha. (além do episódio final, recomendo também a assistirem o episódio especial 21, que contém cenas extras do episódio final do drama a partir do 50:45min).
Ademais, o drama também insere uma reflexão muito interessante em torno das próprias condições biológicas em que cada ser vivo nasce, os psicopatas nascem monstros, mesmo como no caso do drama, rezarem para não serem um. Nesse ínterim, o drama apresenta também algumas reflexões de cunho religioso, no sentido dos propósitos do todo poderoso e da vontade dos seres humanos ao se sentirem sozinhos ou superiores a ele. A questão religiosa tem seu ápice no final do drama quando a história insere a noção de punição, a respeito disso gostei de como a história trouxe o questionamento se os desenrolares da trama foram “uma salvação ou castigo divino para o psicopata?”. A noção de punição na história foi bem atrelada a concepção de redenção. Com isso, Mouse permite acompanhar a punição do vilão que ao mesmo tempo é uma forma de redenção, ligando muito bem com o questionamento inicial da história sobre ser ou não um monstro. O drama suaviza o final do psicopata, fazendo sentirmos certa empatia, ao mesmo tempo que faz isso a obra solidifica que os atos do mesmo foram errados e que ele mereceu sofrer por isso, criando um final poético, justo e coerente.
Mouse não mostra que somente os psicopatas são ruins, mas como cada um também pode ser ruim em sociedade. No fim, em alguma instância somos como ratos, e também como predadores, dependendo da situação que é posta para nós, mesmo aqueles que acham que são caçadores também podem ser uma presa e quem aparenta ser uma presa pode ser um caçador, nesses meus delírios finais quero dizer que Mouse nos apresenta uma história de caça humana que não se restringe apenas um jogo de pegar o predador ou descobrir quem é rato de quem, mas que nos caminhos tortuosos dessa ratoeira nos permite pensar o quanto de ratos existe em nós e quanto de predadores também, delineando que na complexidade dos sentimentos é difícil ser somente uma coisa. Algo mais? Eu amei absolutamente Mouse e as reflexões, adrenalina e a confusão de teorias que foi cada episódio, continua em mim mesmo nessa última linha escrita dessa resenha.
Um comentário em “Mouse: Predadores, presas e a complexidade humana”