Way Back Love: a dor da perda e a preciosidade de estar viva

Way Back Love: a dor da perda e a preciosidade de estar viva

A vida é como uma avalanche. Quando menos esperamos, ela pode nos atingir. Todos nós sabemos disso, de certa forma. Da imprevisibilidade da vida enquanto vivemos. Se não sabemos, ela insiste em nos informar, ou melhor, surpreender. Só se aprende o quanto a vida é imprevisível enquanto se vive. Só entendemos a dor quando ela nos atinge. Jung Hee Wan (Kim Min Ha), enquanto uma adolescente do ensino médio, não poderia saber disso. Ela vivia seus dias de maneira resplandecente, sempre alegre e espontânea, nunca teve medo de viver como queria e de aproveitar o dia. Em seu mundo, em que vivia com seu pai, os dias brilhantes pareciam corriqueiros e ela amava agarrá-los.

Kim Ram Woo (Gong Myung) é um garoto gentil, um introvertido, que vive em sua própria bolha, estuda na mesma classe que Hee Wan. Estar acostumado a nunca criar raízes em lugar nenhum, afinal, ele e sua mãe estão sempre se mudando. Acostumado a nunca ser incomodado e nem notado, ele vive seus dias com resignação, como quem foge dos dias brilhantes, pois eles podem o arrancar do esconderijo que se encontra.

Quando a turma decide pregar uma peça na professora novata e trocar os nomes, de alguma forma Ram Woo troca de nome com Hee Wan. Ela passa a se chamar Kim Ram Woo e ele responde por Jung Hee Wan. A brincadeira dura mais do que Ram Woo esperava, ele já não vê a hora de recuperar seu nome, mas Hee Wan não tem a menor intenção de encerrar aquilo. Com o tempo os dois se acostumam e logo toda a escola os chama pelos nomes trocados. 

Para Hee Wan, o nome de Ram Woo traz sorte. Para Ram Woo, se chamar Hee Wan o arranca para um novo mundo, menos confortável, porém mais brilhante. Ao chamarem um pelo nome do outro, é como se encurtasse a distância entre eles, passo a passo, sílaba por sílaba. E assim, eles se tornam melhores amigos e o primeiro amor um do outro.

No entanto, a primeira cena de Way Back Love não é sobre o primeiro encontro dos dois na adolescência, mas sobre o presente. Conhecemos não uma Hee Wan, alegre e extrovertida, mas sim, uma mulher reclusa, depressiva e solitária. E vemos o Ram Woo batendo à sua porta, como um encontro que não acontecia há muito tempo. Agora, ele é um ceifador, uma espécie de ser sobrenatural que é responsável por levar a alma dos mortos. E uma notícia inesperada sai de seus lábios: Hee Wan tem apenas uma semana de vida. Parece que Hee Wan e Ram Woo trocaram de papel, ele agora está alegre e animado, ela que prefere se esconder do mundo. Então, uma decisão é tomada, antes de morrer Hee Wan precisa cumprir uma lista de desejos que Ram Woo montou para ela. 

Eu estava muito relutante em começar a assistir Way Back Love, porque a premissa apontava para doses de tristeza em grandes quantidades, mas, por algum motivo, a história continuou me chamando. Até que resolvi mergulhar de vez. O drama começa com o presente da protagonista, mas volta para o passado por meio de flashbacks que contam a história em que Ram Woo e Hee Wan se conheceram e se aproximaram. O clima do presente é escuro e sombrio, a cinematografia utilizada é assim. Mas o passado, conta a história de dias alegres e brilhantes, e exala juventude. 

Por si só, isso puxa o telespectador, que fica com curiosidade para saber o que aconteceu no passado, o que exatamente fez a protagonista perder a vontade de viver, e qual o destino dela no futuro. É um contraste interessante, porque permite que o drama não fique muito pesado. Os dias de escola são divertidos e provocam risadas, enquanto os dias no presente são mais melancólicos. Isso cria um equilíbrio na história e ajuda na construção dos personagens.

Nesse sentido, Way Back Love utiliza muito bem os flashbacks em sua história, bem como emprega a fantasia de forma interessante, ela não é o foco da narrativa e, sendo assim, a forma que a insere na narrativa me lembra muito de Doom at your service, na resenha que escrevi sobre o drama, afirmei: “todos enlaces que a trama faz é usando a fantasia para nos mostrar como aceitar a realidade sem fantasia”. E Way Back Love também é assim, a fantasia na história é um recurso para mostrar como a vida é preciosa, para pensar sobre a realidade, a vida e a morte. Um ceifador existe como representação da finitude da vida, da continuidade e da presença de quem amamos, não há a intenção de criar um mundo fantasioso bem elaborado, mas sim, de trabalhar os sentimentos dos personagens. Quando o irreal, o improvável acontece, o real parece mais nítido, como se apenas à luz da fantasia fosse possível enxergar o que sempre esteve diante dos olhos.

Além da fantasia, Way Back Love também é um narrativa com romance, o drama conta uma história de amor dolorida, interrompida pelas ocorrências da vida. Assim, ele nos faz pensar sobre o primeiro amor, todo seu brilho e pureza, e como algo que é belo pode se tornar uma lembrança regada de dor. É uma eterna sensação de “E se”, e se aquilo não tivesse ocorrido, e se decisões não tivessem sido tomadas, à vida à medida que ganha robustez faz questionarmos as escolhas que fazemos, coloca outros caminhos em perspectiva e, em um gesto errôneo, ficamos presos/as em um constante turbilhão de pensamentos sobre tudo aquilo que não fizemos, mas, ficar parado nesse redemoinho de arrependimentos e possibilidades não seria uma maneira de desperdiçar o presente que ainda podemos transformar?

O drama constrói um romance doce, puro e jovem, ele não fica somente no passado dos personagens, quando eles se reencontram o romance ainda está lá. Claro que com o peso das escolhas, da culpa, da dor e do luto, mas os sentimentos ainda são tão belos quanto no passado. Ram Woo deseja que Hee Wan siga em frente, faça as pazes para o passado e, saiba os sentimentos que ele carrega dentro de si. De certa forma, Way Back Love nos mostra uma paixão de adolescente que parece simples, mas que sobrevive ao sobrenatural, a morte e a vida, esse é o tamanho do amor entre eles. É bonito como o enredo reesignifica muitas coisas para nós, e uma delas é que o amor está em nossos corações, e pode continuar existindo mesmo na ausência. Não aquela ausência fruto do descuido ou do desprezo, mas a que não podemos controlar, por conta imprevisibilidade da vida.

Outro ponto que chama atenção em Way Back Love é a troca de nomes, um gesto carregado de sentido para a história. Afinal, trocar de nome aqui é um ato que tem peso simbólico, mas também factual dentro da trama. É como se os personagens se fundissem em um só, como a linha vermelha do destino que os une. Ram Woo atender por Hee Wan, e Hee Wan ser chamada por Ram Woo constrói um laço potente e silencioso entre os dois. Ao mesmo tempo, mostra como o amor é um ato de reciprocidade: são duas pessoas indo na mesma direção, compartilhando juntas.

Quando se ama alguém, há algo de muito mágico na forma como as vidas se imbricam. Existe uma beleza na ideia de que, se você vive o bem para si mesma, se busca viver a vida de forma plena e com leveza, a outra pessoa também se sente feliz. Essa é talvez a forma mais pura do amor.

Quando Hee Wan diz “Porque para nós, me amar é amar você”, ela entrega uma das frases mais bonitas dos k-dramas em 2025. Não só revela a força do laço com Ram Woo, mas mostra que ele é parte essencial de quem ela é. O encontro entre eles foi tão transformador que, não importa o tempo ou a distância, fincaram raízes um no outro.

A troca de nomes expressa essa simbiose profunda, que faz pensar em como carregamos dentro da gente quem a gente ama. Amar a si mesma, nesse contexto, é também um gesto de cuidado por quem te ama. Viver bem, viver com alegria, pode ser uma forma de bem-querer os que ficaram. Porque a ausência, quando tem afeto, nunca é total. Ela se faz presente nas memórias, nos momentos que cultivamos, nas conversas sinceras com o mundo e conosco.

Dito isto, não é surpresa que a química entre Kim Min Ha e Gong Myung seja muito boa, porque ela é uma extensão da atuação dos atores e nisso eles nos apresentaram performances sólidas e cativantes. Kim Min Ha parece ter o dom da naturalidade, é o primeiro trabalho que assisto da atriz, mas já me senti encantada com a facilidade que ela transita entre a melancolia e a felicidade da personagem e expressa as dores dela de forma tão precisa. Gong Myung nasceu para fazer personagens como Ram Woo, doces, gentis e cativantes, ele tem um carisma único que pulsa em sua performance, uma leveza que não deixa de entregar emoções de maneira convincente.

Estou bastante satisfeita com as atuações, com a cinematografia e com a forma que o enredo utiliza de forma tão hábil os 6 episódios que propõe contar a história, se eu tivesse que citar um ponto negativo seria a inserção de uma personagem secundária na trama, a colega de faculdade da Hee Wan, não tem história fundo bem desenvolvida e parece fora de lugar na narrativa. Ela tem um papel importante no enredo, mas quando chega a hora de o exercer, parece quase como se não fosse tão importante assim e pudesse ser descartada. No fim, ela está ali para justificar situações e marcar presença, mas parece solta na trama, algo quase forçado. No geral, só estou recordando dessa reclamação mesmo, por ser uma história curta, acho que Way Back Love executa muito bem sua proposta.

Uma das mensagens do drama é: carregar o peso com delicadeza. É marcante como a obra utiliza cada momento para expressar isso, não apenas no sentido de que viver é carregar um peso dentro de si. Não se trata de construir a vida sem dor, mas aprender a conviver com ela, atribuindo-lhe leveza e sentido. Essa suavidade mesclada com a melancolia está contida até mesmo na forma que a obra é construída, trazendo momentos que partem o coração, que muito provavelmente vão fazer o telespectador chorar – eu não chorei, mas porque meu coração estava uma pedra quando assisti. Mas também, evidenciando momentos felizes e positivos na vida dos personagens.

Assim, todo o peso que o drama contém é, no entanto, construído com leveza. Não é um drama pesado demais, mas não deixa de ser uma história com potência. Sabe aquela sensação agridoce? Pois é. Um leve com gosto amargo, um doce com toque de dor. O que nos faz questionar: Existe algo tão agridoce quanto a vida? Só ela para bater à nossa porta com beleza e dor, com encontros e despedidas.

Um dos acertos de Way Back Love é a delicadeza e precisão em abordar o luto, esse processo em que você perde alguém importante e, na dor, também perde a si mesma. O drama questiona o que é, de fato, perder alguém. Afinal, será que a ausência física é suficiente para definir o fim de uma presença? Com isso, ele não diminui a dor da ausência, mas convida a ressignificá-la. Mostra como a morte é mais sentida por quem fica, porque é quem convive com a dor excruciante, com a culpa e os arrependimentos. A falta que alguém faz pode arrancar toda a vida que antes fazia morada em quem sente, é como cavar um buraco profundo no peito que, quanto mais se entra, mais se perde e mais se encontra o vazio.

Way Back Love tem o cuidado de nos lembrar que o luto não é passageiro. O que é a nossa vida senão uma sucessão de pequenos e grandes lutos? E por não ser passageiro, o luto pode se acumular, nos paralisar e tirar de nós o sentido de estar viva. Se as pessoas que amamos são justamente o que dá sentido à nossa existência, como seguir sem elas? Como encontrar significado quando tudo o que se sente é dor, culpa e uma raiva voltada contra si mesma?

De forma precisa, o drama nos diz que a vida não é só felicidade. O que há por trás de tantos sorrisos? Talvez a dor contida, talvez pessoas que aprenderam a viver com ela. É por isso que admiro a forma como essa história encara temas difíceis como o luto, mas também a depressão e o suícidio, aquele momento em que a única saída parece ser o fim. É curioso pensar que, mesmo ali, no fundo do abismo, ainda há algo que pulsa. E é esse fio quase invisível que Way Back Love segura com firmeza. Porque viver, apesar de tudo, ainda é possível. E às vezes, só de estar viva, já é um começo e uma oportunidade.

Por fim, no meio de tantas reflexões valiosas que o enredo nos propicia, talvez o que Way Back Love queira nos dizer com mais afinco é: a vida vale a pena ser vivida. As lembranças e momentos preciosos que compartilhamos com quem amamos são o combustível para encontrar sentido, elas deixam marcas em nós, porque cada experiência é única e porque a memória é poderosa. Um novo dia que surge. Um novo sorriso que brota no rosto. Uma nova flor que nasce. Nada se repete. Cada dia que amanhece é como uma nova oportunidade. Não esquecer quem somos, quem amamos e fazer as pazes conosco talvez seja a melhor forma de entender a preciosidade de estar viva, de enxergar o mundo com novas lentes e, mesmo com a dor da perda, compreender que ainda estamos aqui, e isso importa. Aprender a caminhar com as ausências, sem esquecer, é o gesto mais bonito de resistência e amor. É assim que atravessamos as avalanches da vida.

Way Back Love está disponível para ser assistido no Viki!

Brenda Mendes

Historiadora, professora e criadora de conteúdo digital, está sempre em busca de uma nova história para desbravar e aquecer seu coração, apaixonada por doramas de romance e slice of life, é uma leitora ávida há mais de 10 anos.

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