Twenty Again: redescobrindo sonhos e a si mesma

Twenty Again conta a história de Ha No-ra, uma mulher de 40 anos que vê seu mundo ruir quando o marido pede o divórcio e estabelece um prazo para que a separação se concretize, com todos os papéis assinados. No entanto, Ha No-ra não deseja esse divórcio e decide entrar em uma faculdade, já que o marido alega que a separação se deve ao fato dele não conseguir se comunicar com a esposa, afirmando que ela não é inteligente o suficiente, uma vez que ele é professor universitário.
Diante disso, Ha No-ra estuda para o vestibular e ingressa na faculdade, mesmo com as recusas do marido e de seu filho de 20 anos. No entanto, ela não poderia imaginar que, a partir desse ponto, sua vida sofreria uma reviravolta, fazendo-a refletir sobre todas as decisões adotadas nos últimos anos. Na faculdade, Ha No-ra reencontra seu amigo de adolescência, Cha Hyun-suk, que agora é um renomado produtor e professor de uma das disciplinas que ela frequenta. Esse novo universo desafia Ha No-ra a enfrentar questões pendentes e a encarar os desafios que surgem em seu caminho.
Twenty Again é um K-drama bastante interessante. Antes de assistir, pensei se tratar de uma história bem mais densa, mas, muito pelo contrário, a trama é surpreendentemente leve, simples e divertida. No entanto, não se enganem: o fato de ter essas características não significa que a série não aborde questões sérias e importantes. É uma narrativa com enfoques bastante realistas, capaz de arrancar lágrimas, muitas risadas e reflexões.
Primeiramente, é uma obra que se propõe a discorrer sobre a vida de uma mulher de 40 anos e, indiretamente, sobre todos os que estão envolvidos com ela: seu filho, seu marido e seu amigo de adolescência. Para que vocês entendam melhor, a protagonista Ha No-ra (Choi Ji-woo) é uma mulher que parece ter parado no tempo. Engravidou muito jovem, ainda no ensino médio, e desde então viveu exclusivamente para o filho e o marido. Sua voz foi sendo suprimida à medida que seu casamento se desenrolava. Afinal, ela se casou com um homem que mal conhecia e, longe de sua família, sem ter a quem recorrer, teve que enfrentar abusos psicológicos e reclusão.
No primeiro episódio do drama, conhecemos uma No-ra submissa, sempre pronta a servir o marido e a casa, passiva, sem se impor, tentando agradar a todos. Ao mesmo tempo, o drama nos permite visualizar uma No-ra do passado totalmente diferente: alegre, impositiva, determinada e com o grande sonho de ser bailarina antes de tudo acontecer.
Dito isso, o que mais amo em Twenty Again é o desenvolvimento da protagonista ao longo da história. É uma jornada de crescimento e libertação que enche nossos olhos de orgulho e de lágrimas. A série nos proporciona uma personagem carismática e humana, por quem é impossível não torcer. Sua pureza, força e bondade nos conquistam. É maravilhoso acompanhar suas aventuras em um ambiente totalmente novo, mas ainda mais envolvente é vê-la redescobrindo a si mesma, seus desejos e sonhos, reconhecendo seus arrependimentos e tendo coragem para enfrentar a realidade. Tudo isso faz com que o público se identifique e sinta a personagem como uma pessoa próxima.
Ao longo da trama, conhecemos diferentes facetas de No-ra: a jovem sonhadora, a mãe dedicada e a esposa aprisionada. Além da protagonista, também nos aprofundamos nas vivências de outros personagens, como seu amigo de adolescência, seu marido e seu filho.

Cha Hyun-suk (Lee Sang-yoon) é o amigo de adolescência de No-ra. Eles estudaram juntos em uma escola de artes e ele era apaixonado por ela, até que No-ra desaparece sem deixar notícias. Desde então, Hyun-suk guarda mágoa e, ao reencontrá-la como professor universitário, inicialmente a trata com indiferença e arrogância. Ele é um personagem que me despertou sentimentos mistos: ora adorável, ora infantil e irritante – definitamente um personagem que fico no amor e ódio, porque desaprovo personagens arrogantes, mas já que o drama é de 2016, ainda relevei muita coisa. Apesar de algumas atitudes imaturas, ele tem um papel importante no desenvolvimento de No-ra, e o romance que se forma entre eles é fofo, apesar dos tropeços.
O romance que se forma entre No-ra e Hyun-suk evoca as personalidades do passado de ambos. Juntos, eles voltam a ser dois adolescentes, e talvez seja por isso que, na maior parte da história, protagonizam tantos desentendimentos. Embora o romance não seja o foco de Twenty Again, ele se torna um plano de fundo doce e envolvente. Apesar de se desenvolver lentamente, tem momentos que aquecem o coração, e eu me peguei torcendo por eles, mesmo com algumas frustrações.
É um romance lento e delicado, e não há problema nisso. No entanto, minha única ressalva em relação a essa parte da história é que os protagonistas, apesar de terem mais de 30 anos, não são tratados como adultos no sentido de vivenciarem um romance com mais maturidade. Eles ainda se comportam com uma pureza e ingenuidade que não correspondem completamente às suas idades. Além disso, a narrativa prolonga bastante a construção do romance, fazendo com que a reta final pareça um pouco apressada.
Ainda assim, a relação entre No-ra e Hyun-suk transmite uma mensagem bonita sobre segundas chances no amor — ou até mesmo sobre ter, pela primeira vez, uma chance verdadeira. A história nos lembra de que, quando algo não deu certo no passado, pode haver uma razão para isso. Como muitas tramas românticas coreanas, esse romance também tem um toque de destino. É interessante notar como No-ra e Hyun-suk sempre se apoiaram ao longo da vida, desejando o melhor um para o outro. Esse companheirismo contrasta com a falta de apoio e cumplicidade que No-ra experimentou em seu casamento, tornando essa relação ainda mais significativa.

Já o marido de No-ra, Kim Woo-chul (Won Young-choi), é um personagem insuportável. Narcisista e arrogante, ele menospreza a esposa e acredita que o mundo gira ao seu redor. O drama retrata bem como um casamento pode se tornar abusivo e sufocante, especialmente para uma mulher que se vê restrita ao lar e sem apoio. Ver No-ra se impondo e percebendo seus verdadeiros sentimentos em relação a ele é uma das partes mais gratificantes da narrativa.
Acredito que o marido (ex) de No-ra traz para a trama reflexões bastante importantes sobre o casamento, como a forma em que um relacionamento pode se tornar abusivo e podar a liberdade de uma pessoa — no caso, uma mulher, que acaba restrita ao lar e aos papéis que lhe são impostos. Além disso, a história evidencia a toxicidade de muitas pessoas ao nosso redor e como é possível sentir-se solitário e diminuído dentro de uma relação.
O personagem Woo-chul, o marido, é um retrato preciso de pessoas egoístas que vivem apenas para si mesmas. Sua maneira de pensar e agir é muito interessante de se observar. Gostei de perceber essas facetas humanas em todos os personagens da história, e Woo-chul, em particular, tem uma veia desprezível e cômica que combina muito bem com a narrativa.
O filho de No-ra, Kim Min-soo (Kim Min-jae), tem sua própria jornada dentro da trama. Ele é o filho de 20 anos de No-ra e tem um arco interessante, pois passou a vida inteira seguindo as vontades do pai. Durante o ensino médio, estudou intensamente porque era o que o pai desejava e, ao entrar na universidade, seguiu o curso que lhe foi imposto.
No entanto, ao ingressar na faculdade, Min-soo se depara com diversas questões internas que precisa resolver. Logo nos primeiros dias de aula, ele começa a namorar Hye-min (Son Na-eun), e, pela primeira vez, precisa dividir seu tempo entre os estudos e um relacionamento. Isso o leva a questionar o caminho que escolheu seguir: será que estudar é realmente a única coisa que importa? O que significa ser um adulto? O que ele realmente deseja para sua vida? Essas e outras reflexões são apresentadas ao longo de sua trajetória.

Além disso, vemos o desenrolar do romance entre Min-soo e Hye-min. Sinceramente, não posso dizer que me apeguei ao casal. Na verdade, fiquei bastante indiferente. Acredito que a aproximação entre os dois poderia ter sido melhor contextualizada, pois não consegui identificar exatamente quando os sentimentos surgiram. Para mim, pareceu mais uma questão de conveniência.
Além disso, em alguns momentos, Hye-min se mostrou uma personagem um tanto irritante. Embora Min-soo também tenha sua parcela de responsabilidade, ela frequentemente recorria a joguinhos desnecessários. No entanto, devo reconhecer que o romance serviu como um instrumento para que ambos refletissem sobre suas próprias perspectivas de vida e amadurecessem um pouco.
No fim, sinto que o drama não deu um desfecho satisfatório para Min-soo. Não entendi claramente o que aconteceu com ele, mas talvez isso tenha passado despercebido porque assisti à história com certa pressa, com medo de que saísse da Netflix (risos). Além disso, Hye-min foi uma personagem pouco desenvolvida. Não conhecemos sua origem ou outras informações que poderiam ter aprofundado sua história, o que, para mim, foi um ponto fraco na narrativa.
Com o personagem de Min-soo, também temos a introdução da relação mãe e filho na narrativa, já que Min-soo não tratava bem sua mãe (em grande parte pela influência do idiota do pai). Aos poucos, o drama vai desvendando os sentimentos do filho em relação à mãe e mostrando a redenção dessa relação, além do apoio que se estabelece entre ambos. Acredito que uma das cenas mais bonitas do drama é protagonizada por Min-soo e sua mãe No-ra, que chega a provocar até lágrimas.
O dorama traz à tona uma discussão importante sobre ser mãe, sobre como uma mãe faz tanto pelos filhos, e como muitas vezes eles não percebem ou não valorizam o suficiente. Todas as decisões de No-ra foram para o bem de Min-soo, e é emocionante perceber isso. Acredito que para as pessoas que são mães, o drama e a trajetória de No-ra como mãe são profundamente identificáveis, com todos os esforços que ela teve que fazer.
Twenty Again propicia a observação de muitos aspectos da cultura da Coreia do Sul. Para mim, ficou mais uma vez nítido como é uma sociedade bastante machista. Ao retratar essa realidade, é impossível, com um olhar crítico, não perceber isso, afinal, vemos os comportamentos e vivências de uma mulher de 40 anos dentro da sociedade. É triste pensar que muitas pessoas chegam a normalizar as situações que a protagonista sofre.
Outro ponto que achei bastante curioso de assistir é a própria configuração do ambiente universitário. Um dos charmes da história é transcorrer a maior parte de sua narrativa em uma faculdade, no sentido de que o drama mostra bem como a hierarquização da sociedade sul-coreana gera alguns problemas. A protagonista é discriminada dentro da universidade por ser uma mulher mais velha querendo estudar. Não pude deixar de me questionar como a faculdade é vista como um ambiente apenas para jovens e como isso acarreta prejuízos alarmantes para as pessoas mais velhas que têm o sonho de cursar algo. Foi bastante incômodo perceber a protagonista sendo discriminada por uma questão como essa, mas gostei de como a história colocou em pauta a perspectiva dos estudantes mais jovens também, assim como a pressão que eles sofrem na universidade, permitindo discutir temas como o assédio sexual, mesmo que não de forma profunda.
Gostaria de comentar mais sobre esses pontos, mas não o farei, pois corre o risco de eu me alongar mais do que já estou nesta resenha e acabar soltando spoilers.
Por fim, acredito que Twenty Again faz um ótimo trabalho ao mostrar os recomeços na vida de uma mulher de 40 anos. É uma jornada inspiradora e emocionante. O drama fala muito sobre vivermos o agora, como a vida pode acabar em um instante e nós não termos vivido todos os nossos sonhos e tudo o que queríamos. A trama também destaca como é importante cultivar sonhos, mas também como existem momentos em que a realidade bate à porta e é preciso deixar ir. O melhor é que a obra nos puxa para uma verdadeira jornada de reflexão sobre os últimos anos de nossa vida, sobre a forma como estamos vivendo, sobre nossas amizades e relacionamentos. Twenty Again nos incentiva a vivermos sem arrependimentos, sermos nós mesmos e, se for preciso, buscarmos nossa essência, mesmo que ela esteja perdida há vinte anos. O K-drama nos convida a termos para sempre vinte anos, afinal, o tempo perdido pode sempre ser reencontrado. Cultivar a juventude que há em nós talvez seja um dos caminhos para vivermos vividamente, já que nunca é tarde para recomeçar das mais variadas formas.
Essa resenha foi escrita em 2021, na época que Twenty Again ainda estava disponível na Netflix, hoje ele não está disponível em nenhum streaming. Porém, se procurar com afinco, ainda é possível encontrá-lo.